terça-feira, 22 de setembro de 2009

O que me resta pra seguir


Quando escrevo alguma coisa, geralmente não sei o que vou dizer até que termine. Escrevo justamente pra ficar sabendo. E tudo o que se escreve são experiências. Escrevemos sobre o que vivemos, vimos, aprendemos. Portanto, sempre que escrevemos, nos revelamos aos outros e a nós mesmos.

Dia desses andei pensando: gosto muito de reparar os outros. Gosto de definí-los, descrevê-los, diferenciá-los. Fulano é assim, beltrano é assado... No entanto, não tenho a mínima capacidade de dizer como eu sou. Quem sou eu? Não sei dizer, talvez por falta de perspectiva ou por medo de realmente descobrir e, no fim, ficar muito desapontado. Quando alguém descreve alguma característica minha eu tenho sempre a impressão de que se está falando de qualquer outra pessoa, menos de mim. Por isso afirmo: eu não sei quem sou eu. Eu não me conheço. Ainda não me fui devidamente apresentado.

Alguém disse, acho que foi Gertrude Stein, que o jovem é um ser que se esforça, até os trinta anos, pra destruir tudo o que ele tem de melhor. Hoje, com trinta anos, sinto que é hora de parar e fazer um apanhado do que me resta pra começar a viver. Preciso saber com o que conto pra continuar. começo a traçar planos e metas, que, naturalmente, nunca vou cumprir. É o ‘quando eu crescer’ de quem cresceu.

Perdi a inocência. Nem de todo a esperança, mas não espero mais, do além ou do destino, nenhum tipo de concessão ou transigência. Tenho plena consciência de que preciso me construir peça por peça. Errando e acertando, pois, como disse Riobaldo, em Grande Sertão: Veredas, "Viver — não é? — é muito perigoso. Porque ainda não se sabe. Porque aprender-a-viver é que é o viver mesmo".

Há diversas maneiras de me definir, mas a única que realmente me causa certo orgulho é ser pai de Anna Luiza. Ela nasceu aos 12 de outubro do ano 2000. Antes de nascer eu sentia saudades dela. Não me aguentava de vontade de conhecê-la logo. Até que nasceu: meio verde acinzentada, chorando e fazendo um monte de caretas. Não era nada do que eu esperava. Pra mim ia nascer um neném maravilhoso, limpinho e que reconheceria a minha voz e sorriria quando me visse. Não, não foi bem assim. Nasceu uma coisinha enrugada, com cara de raiva e resmungona. Foi a coisinha feia mais linda que eu vi. E eu me apaixonei eterna e definitivamente. Hoje ela está em vias de completar nove anos de idade. Tem o corpo da mãe e o molejo do pai. O que ela vai ser quando crescer eu ainda não sei, mas tenho certeza de que não será dançarina.

Eu sou uma pessoa meio desengonçada. Não sei andar direito, não sei onde colocar as mãos, não sei conversar sem me perder e esquecer o que estava falando. Discuto sobre tudo, sem sequer conhecer o assunto. Sou anti-prático. Penso muito, mas não consigo agir. Não gosto de falar ao telefone. Não sei escrever sem cometer os mais estúpidos erros de português. Gosto da cor amarela, não gosto de bife de fígado, nem de quiabo, nem de galinha caipira. Fora isso, sou mineiro, modéstia à parte.

Como todo mineiro, gosto da simplicidade, embora tudo pra mim seja muito complicado. Não sei viver simples. Apaixonar-me é um grande acontecimento que está sempre acontecendo e desacontecendo. Geralmente preciso praticar uma verdadeira violência contra meus sentimentos pra me desapaixonar, quando percebo que vou quebrar a cara. E acabo quebrando a cara do mesmo jeito. Não sei dizer: “eu te amo”. Mas como eu amo! Amo a ponto de doer. Mas tudo são motivos pra eu não me entregar. Como diria Fernando Sabino, citando seu pai, “antes de entrar, veja por onde vai sair”. Por isso acabo saindo antes de haver entrado. Tenho um medo terrível de machucar os outros ou a mim mesmo. E é justamente por isso que acabo, invariavelmente, machucando.

Vivo com uma sensação permanente de estar engasgado. Às vezes sinto que vou me afogar, então começo a escrever. Na verdade, eu preciso é da convivência com as pessoas e, como eu sou muito desajeitado para a convivência e para a vida prática, escrever se tronou, pra mim, a forma mais segura de encontrar o outro. cheguei a dizer que escrevendo, me acho um ótimo sujeito, mas vivendo, sou um péssimo escritor.

Não tenho fascínio por dinheiro, embora quisesse ter o bastante justamente para não precisar dele. Não precisar me preocupar com ele. Não quero ser rico. Quero viver confortavelmente, sem privações.

Comodista, sou até meio preguiçoso. Mas sou muito entusiasmável também. Quando me entusiasmo, entro numa espécie de transe que me confere uma empolgação e um senso de eficiência que, da mesma forma que me arrebata às alturas da vida prática, esvai-se subitamente. Por isso raramente termino algo que começo. E estou sempre começando.

Música, pra mim, é uma coisa maravilhosa. Chego a pensar que é impossível viver sem música. Gosto especialmente de música Clássica, MPB e músicas regionais, por causa da simplicidade que referi acima. Gosto dos cantores e compositores mineiros. Gosto de Minas Gerais. Se tivesse nascido em outro estado eu seria frustrado.

Gosto do cerrado, passarinho voando, gosto de pescar, da lua, de montanhas, de gente simples, de rio, de pão com ovo... e mais que tudo, gosto das pessoas que eu gosto. Chego a pensar, agora, que o que eu sou mesmo, é o que eu sinto pelos outros. Foi assim que eu aprendi a amar, a chorar e a sentir saudade. E é isso que me resta pra seguir e recomeçar sempre que for preciso.

3 comentários:

Unknown disse...

Eu não sei como esse comentário vai sair porque Graziela, sua prima com grave crise dos 30, descobriu que pode conversar comigo pela "chamada pelo msn". "Querí-dá, me dê atenção". Mute nela, por enquanto.
Mas ela disse algo que pareceu tanto com você: "Amanhã eu queria fazer tal coisa, mas nem vou pensar não, que no fim dá errado mesmo." Que sem graça né, entrar pensando em como vai sair? Não deve ser muito divertido... Mas mesmo tão desesperançoso, esse seu post realizou o irrealizável de falar de si mesmo e ser fiel. Eu gostei bastante. Em breve vou copiar e te mandar ele por depoimento, como se fosse meu. Todo mundo vai me parabenizar. ^^
E eu ri um bocado disso: "Tem o corpo da mãe e o molejo do pai. O que ela vai ser quando crescer eu ainda não sei, mas tenho certeza de que não será dançarina." Eu também tenho hahahahahaha.

E eu não sabia que você não gostava de quiabo! Por quê?

nathi disse...

Tem tanta coisa que eu poderia dizer agora, mas sabe aquela sensação que você tem muito a dizer mas não consegue dizer nada? Você sabe o que eu penso, já tentei te definir. Se um professor de Física te definisse ele diria que você é "potencial em repouso". Um historiador diria que você é um "mártir frustrado". Um matemático te chamaria de "inequação" ou "incógnita". Eu diria que você é uma cama de gato. Um paradoxo. E tudo aquilo que eu já te disse uma vez. Se eu pudesse te dizer alguma coisa agora, como a amiga que fui, diria pra você não se acomodar. Por mais que você seja preguiçoso, ficar parado não leva ninguém a lugar nenhum.

Vivi Ramalho disse...

Não importa se for poesia ,nem prosa,romance policial , BIBLIOGRAFIA, ou até mesmo auto ajuda ...
Eu quero o livro , e com dedicatória!!!!
Nem preciso dizer mais nada né!?