sábado, 19 de setembro de 2009

A Roupa Nova do Rei


Quando era adolescente, tinha um amigo meu que dizia que eu era muito inconveniente. Dizia que eu brincava em momentos errados, era irreverente demais e, o pior: ficava muito à vontade com pessoas que eu mal conhecia. Isso, segundo ele, era muito inconveniente. Mas pra falar a verdade, eu gostava de me sentir à vontade com as pessoas. Não sabia que isso era inconveniente.

Conveniências! O quanto a gente não deixa de viver e de ser realmente sincero por causa das conveniências! Também chamadas regras de convivência, elas nos tolhem a naturalidade. Se estou apaixonado, por exemplo, mantenho isso escondido, faço 'charme', adio o máximo possível o 'eu te amo', pra que a pessoa amada não saiba meus desígnios. A gente acaba ficando mesmo com vergonha de estar apaixonado.

É como aquela história da roupa nova do rei: Uma grande multidão se reuniu para admirar a roupa nova que o rei encomendara de alfaiates mágicos, que costurariam um vestido real com um tecido mágico. Só os inteligentes e os puros de coração seriam capazes de ver esse vestido. E entra o rei, no grande salão, portando uma barriga pelancuda, apenas de ceroulas, feitas de pano comum. Todos começam a segurar o riso, mas, pra não passar por estúpido, diziam: "que roupa linda, que tecido maravilhoso!" Mas lá do meio da multidão, só uma criança tem coragem de, se estrebuchando de tanto rir, gritar: "O rei tá pelado!"

É isso o que acontece. A gente tem mania de querer fingir, representar, dizer o que esperam que a gente diga e não o que a gente realmente quer dizer. Escondemos sentimentos. Tudo porque não temos mais a inocência da criança pra admitir: "o rei está nu".

Eu também perdi muito da inocência, mas ainda mora uma criança inconveniente e mal-criada dentro de mim, que é a responsável pelos meus momentos mais sinceros e felizes. Se amo, é ela quem ama, se rio, é ela quem ri. Se choro, ela me diz pra deixar de bobagem, que homem não chora, mas acaba chorando junto comigo pelos motivos mais bobos. E assim vou vivendo, eu e minha inconveniência. Sou mesmo inconveniente, porque convivo. Sempre fui. E sempre me envolvi em situações as mais complicadas por isso. Mas gosto de ser assim, porque ser inconveniente é amar o outro com sinceridade. É estar feliz com quem está perto, porque juntos, podemos admitir, entre nós: "vamos deixar de bobagem, porque o rei está, realmente, pelado".

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